A crônica de todo o dia

Saudade do tempo que malandro era malandro, mesmo

Foto ilustrativa: Pixabay

A crônica de todo o dia

*Carlos Galetti

Sabe aquela música do Chico Buarque, acho que é “Cotidiano”?

“- Todo dia ela faz tudo sempre igual, me sacode às seis horas da manhã…”

E lá vai o cristão sacudindo num trem da Central em direção ao trabalho, quatro horas pra ir e quatro pra voltar, isso mesmo, oito horas no transporte público do Rio de Janeiro, para ir ao trabalho, lá se foram oito horas de vida.

Ainda é assediado pelo patrão que o chama de vagabundo, só porque demora um pouco no banheiro, mas também como não tirar uma pestana no sanitário, ficou com a rapaziada até tarde, tomou umas e outras, não deixou cair um pinguinho no chão, tinha que ficar de ressaca.

Ou então vai ser como o personagem do Zeca Pagodinho que se regenerou:

“- Eu não sei se ela fez feitiço, macumba ou coisa assim, eu só sei que estou bem com ela e a vida é melhor pra mim. Eu deixei de ser pé de cana, eu deixei de ser vagabundo, aumentei minha fé em Cristo, sou bem quisto por todo mundo.

Na hora de trabalhar, levanto sem reclamar, quando o galo canta já vou. A noite volto pro lar, pra tomar banho e jantar, só tomo uma no bar, bastou.”

Assim é fácil, de bem com a patroa, com o patrão e sob controle.

Saudade do tempo que malandro era malandro, mesmo, “agora sacode num trem da Central, abandonou a navalha, tem mulher e filho tal e tal, dizem as mais línguas que ele até trabalha.” (Chico Buarque)

Hoje o malandro é poeta, “encartolado nas poesias do samba, falando de rosas que não falam, mas exalam o perfume que roubam de ti” (Cartola). Ou, então, o malandro que fica mais perdido que cego em tiroteio, quando sua amada vai embora e se despede num papel de pão. Muita falta de consideração (Jorge Aragão).

Ainda, aquela que, vingativa, deixa o pinho (violão) quebrado no chão. Imagine chegar no barraco e encontrar… “Encontrei hoje cedo no meu barracão minha roupa de conde no chão, fantasia de plumas azuis a rolar. E achei em pedaços bem junto a janela, o meu pinho quebrado por ela, tal e qual sucedeu na canção popular… “(O Conde, de Miltinho).

Muita desgraça, mas todo dia de “papaco”, tem seu dia de “dadaco”. O sujeito sempre sacaneando a mulata, chega o dia do basta, o dia da vingança. Isso quando não expulsa o negão sem roupa, correndo morro abaixo, escondendo as coisas íntimas, ainda com alguns respingos de água fervendo.

Tudo bem, depois vira música, pra rir ou pra chorar.

Por isso que gosto de samba que fale de amor, nada de tristeza ou desgraça. Gosto do sorriso e do rebolado da mulata, que te embala na batida compassada do pensamento, trazendo de volta momentos de um passado, às vezes longínquo, mas sempre dignos de serem relembrados.

Deixo-vos com seus pensamentos, enquanto isso ouço mais um pouco, cada música é uma história, uma recordação, uma terna lembrança. Inté!

Carlos A. M. Galetti é coronel da reserva do Exército, foi comandante do 34o Batalhão de Infantaria Motorizado. Atualmente é empresário no ramo de segurança, sendo sócio proprietário do Grupo Iguasseg. 

Vivendo em Foz já há mais de 20 anos, veio do Rio de Janeiro, sua terra natal, no ano de 1999, para assumir o comando do batalhão.

Sair da versão mobile