A vida de Juvêncio
*Por Carlos Galetti
Juvêncio já fizera de quase tudo nessa vida, desde coroinha até pistoleiro no cangaço. Conhecia os homens matreiros e as mulheres da vida, aprendera a rezar desde novo, mas também a tirar uma vida como ninguém.
Ainda rapaz, muito bonito, aceitou o convite de um grupo de jagunços, seguindo para o sertão. Lá pulou de grupo em grupo, até que integrou o grupo de Lampião.
Mas adorava um rabo de saia, brincava muito com as quengas, mas algumas vezes, devido à boa pinta, se engraçava com alguma mulher do cangaço, mulher de cangaceiro é chave de cadeia.
Assim, ia levando a vida naquele agreste sofrido, se agarrando ao “Padinho Ciço Romão Batista”, o Santo Padre do sertão.
Foi quando se cruzaram os caminhos de Juvêncio e Maria Bonita, pois veja, tanta mulher pra cruzar seu caminho, foi se engraçar com a mulher de Lampião.
Era quermesse em Caruaru, as mulheres do cangaço vestiram-se de forma discreta, visando não chamar a atenção.
Alguns cabras foram designados para fazer a segurança das meninas, dentre os quais estava Juvêncio. Infeliz destino, iria encontrar com Maria Bonita.
A festança se desenvolvia solta, muita música, a sanfona gritando naquele imenso sertão e a poeira levantando tal qual nuvem de fantasma. Os cangaceiros que estavam na segurança deviam dançar com as moças, “mode” não andarem em braços estranhos.
Claro que Juvêncio deu seu jeitinho de atender Maria Bonita, dançou com a nordestina o quanto pode. Mal imaginava que tudo era de caso sabido, pois alguns cangaceiros, inclusive Lampião, estavam cabreiros com o comportamento de Juvêncio com as mulheres, então resolveram aprontar com o dito.
Eis que o bando chega na festa de Caruaru, o silêncio é profundo, a sanfona silencia, o triângulo emudece e nem o cachorro late mais. Os casais que levantavam a poeira no salão estavam paralisados, inclusive Juvêncio e Maria Bonita.
Lampião se dirigindo à Maria Bonita, diz que depois conversariam, mandando que se retire para fora do salão. Juvêncio nota que todos os cangaceiros estão a sua volta, pressentindo o pior. Lampião lhe dirige a palavra.
– Olhe, não sei até onde vai a sua culpa, por isso vou lhe soltar no sertão, sem cavalo, para que você, em sua longa caminhada possa se julgar se tem sido fiel a amizade que lhe dedicamos.
Além do mais sugiro que não ande muito devagar, pois posso mudar de ideia e enviar meus cangaceiros para finalizar o trabalho não feito aqui, para não estragar a festa.
Juvêncio andou e correu nem sabe o quanto, e talvez esteja correndo inté hoje. Passou fome e frio, necessidades físicas e orgânicas, chegando a conversar com os anjos, achando que era sua hora.
Até que avistou ao longe uma torre de igreja, aproximando-se e pedindo ajuda.
Muito tempo se tinha passado, o bando de lampião havia sido derrotado pela “volante” dos jagunços da cidade.
Juvêncio não era mais o jovem bonito, trabalhava na igreja de uma cidade no interior do sertão. Tinha mulher, uma só, e três filhos, certamente aprendera a lição.
Mas a fruta não cai longe do pé, o filho mais velho de Juvêncio lembra o jovem do passado; não pode ver um rabo de saia, fica possuído. Juvêncio terá que lhe contar uma certa história.
Vai saber…
*Carlos A. M. Galetti é coronel da reserva do Exército, foi comandante do 34o Batalhão de Infantaria Motorizado. Atualmente é empresário no ramo de segurança, sendo sócio proprietário do Grupo Iguasseg.
Vivendo em Foz já há mais de 20 anos, veio do Rio de Janeiro, sua terra natal, no ano de 1999, para assumir o comando do batalhão.