Eclusas em Itaipu: projeto não leva em conta custos e riscos ao ambiente e à produção

Pelo lado paraguaio, seriam necessárias quatro eclusas para transpor os 118 metros de altura da barragem.

Na teoria, a construção de eclusas para permitir que embarcações transponham a barragem de Itaipu é uma ideia fantástica! A navegação seria possível entre o Brasil, o Paraguai e a Argentina, a um custo de transporte inferior ao rodoviário ou até ferroviário (se no Brasil este meio de transporte fosse de fato utilizado).

Na prática, a história é bem outra. Em primeiro lugar, há a questão dos custos. Um amplo estudo feito pelo Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), em 2011, concluiu que nem a alternativa de eclusas nem o de polos intermodais (a transposição da barragem seria feita por terra) seriam viáveis, devido aos custos elevados.

O estudo mostrou que, de fato, a alternativa de eclusas pela margem paraguaia, como prevê o recente estudo feito por duas empresas europeias, custeado pela Itaipu no Paraguai, seria o mais condizente para a transposição da usina.

Mas não se falou em custos. Já o estudo do BID indicou que a obra, se iniciada à época, representaria um investimento superior a US$ 1,4 bilhão.

Ao fazer uma projeção do volume de cargas durante os anos seguintes à conclusão das eclusas, o BID conluiu que, para o empreendimento ser viável, “é necessário que o investimento no sistema de eclusas da margem paraguaia seja aproximadamente 70% inferior que aquele estimado”.

Sem contar que A estimativa de custos já era considerada baixa pelo BID. “A estimativa de investimentos, em grande medida, já é conservadora, pois está balizada pelos investimentos em obras civis e não considera custos de projetos, por exemplo.”

Questão ambiental

É claro que uma obra desse porte – o canal de desvio da barragem seria quase duas vezes mais profundo que o de Kieldrecht, na Bélgica, hoje o maior do mundo – teria uma série de inconvenientes ambientais.

Se as eclusas estivessem previstas no projeto original de Itaipu, como seria ideal, o canal seria uma obra a mais dentro do gigantismo da usina. Hoje, afetaria toda a região do entorno.

Guaíra, mais uma vez, sofreria com a obra, como à época foi prejudicada com a construção de Itaipu. É que, para tornar navegável o trecho do reservatório e do Rio Paraná na região, será preciso fazer explosões subterrâneas, para retirar as rochas que impediriam a passagem de barcaças, na região onde estão afundadas as Sete Quedas.

Em 1994 e 1995, já foi necessário dinamitar rochas na região de Guaíra, o que provocou muitas queixas da população, principalmente dos pescadores. É que o derrocamento, como é chamado, é quase uma tragédia ambiental.

Navegação

Em seu estudo, além de calcular os investimentos e custos operacionais, o BID analisou também as condições de navegação a montante (acima) e a jusante (abaixo) da barragem.

A conclusão é que, a montante, no trecho crítico do canal de Guaíra, poderiam passar embarcações navegando a uma profundidade de apenas 2,5 metros, em 73% do tempo. Vale lembrar que há poucos dias, em Yacyretá, a profundidade estava nesse nível e foi preciso diminuir a produção da usina para que chegasse aos 3 metros necessários para barcaças cheias.

No caso de Guaíra, então, o derrocamento precisaria ser feito para aumentar a profundidade do canal para 3 metros, conforme o BID alertava.

Já a navegação a jusante é viável em 100% do tempo, “mas é sabido que a velocidade das águas do rio neste tramo pode trazer dificuldades a esta navegabilidade”, diz o BID.

E a água?

Há ainda outras questões importantes, como a água necessária para o canal de desvio de Itaipu. No Canal do Panamá, para ficar num exemplo bem maior do que o previsto para Itaipu, a água da bacia que abastece o canal de navegação também tem que atender a população de 1,7 milhão de habitantes.

Em 2015, a pior seca registrada no país obrigou a baixar o calado do canal e a reduzir a passagem de navios. Fortes chuvas, no ano seguinte, normalizaram a situação, mas as mudanças climáticas que o mundo sofre não dão garantias de que fenômenos como o de 2015 não se repetirão.

No caso do reservatório de Itaipu, a água não atende apenas a produção da usina. Pelo Código das Águas, a prioridade é a dessedentação do ser humano; depois, dos animais; em terceiro, o uso múltiplo; e em quarto lugar, a produção de energia.

A Sanepar utiliza a água do reservatório para abastecer parte de Foz do Iguaçu e das cidades vizinhas. Isso também ocorre em algumas localidades paraguaias. Há ainda muitos sistemas de irrigação que utilizam o reservatório.

Com as eclusas, parte da água que seria utilizada para produzir energia teria que passar pelo canal de navegação.

Em períodos normais, praticamente não haveria problemas. Mas em caso de estiagens, como a que vivemos agora? Paralisaria o canal ou reduziria a produção de Itaipu?

Voltaremos ao tema. O que parece uma maravilha – a integração hidroviária entre Brasil, Paraguai, Argentina e até o Uruguai – pode se tornar uma armadilha para o futuro.

Vídeo

Veja um trechinho do vídeo produzido pela Itaipu paraguaia para mostrar como seria o sistema de eclusas:

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