Isso é morrer feliz

Sei que alguns vão dizer que somos doidos, mas fizemos, absolutamente, o que o Seu Américo fez tantas vezes conosco

Foto ilustrativa: Pixabay

Isso é morrer feliz

*Por Carlos Galetti

Em certas “estórias” é preciso guardar as identidades dos figurantes, visando evitar constrangimentos ou queima de arquivo. O fato que vamos narrar aconteceu lá no Rio de Janeiro, portanto bem longe, sendo aqui tratado como curiosidade, tão somente.

Vamos chamá-lo de Seu Américo, empresário bem-sucedido, dono de supermercado; digamos um sujeito bem arrumado e bem-quisto na localidade e na sociedade que integrava. Seus filhos, e eram muitos, seguiam os caminhos do pai, todos formados, bem-sucedidos.

Seu Américo contava com 74 anos, apresentando boa vitalidade, mas pecando em certos aspectos que o distinguiu ao longo da vida. Seu desejo sexual, no passado tão em evidência, agora regulava nas tentativas e nos inúmeros erros.

O nosso ilustre conversou com o médico, buscando uma solução milagrosa e oportuna, sendo-lhe receitado um remédio indicado para sua idade avançada, sem efeitos colaterais preocupantes. Tudo isso, depois de exames completos, que sempre fazia a cada seis meses.

Eu conhecia pelo menos uma meia dúzia de filhos do Seu Américo. Todos eram meus amigos, seus parentes eram meus parentes, enfim, éramos uma grande família.

Mas, continuando, os filhos apoiavam Seu Américo no trabalho, sendo seus sócios nos negócios, ou gerenciando outros negócios, ou, ainda, tendo seus próprios negócios. Conheciam, inclusive, a mulher que saía com o pai todas as quartas-feiras, quando iam em um motel, sempre o mesmo, onde desfrutavam suas horas de alegria.

Isso ocorreu até que, em certa oportunidade, os filhos que trabalhavam com ele no mercado receberam uma ligação, informando do passamento do Seu Américo no motel.

Com muita calma, ligaram para um médico conhecido, que já de posse de uma ambulância, foi ao motel, retirando o corpo de forma bem discreta, levando-o para o hospital, onde foi dada entrada e óbito.

Na ocasião, eu servia numa cidade do interior do Rio de Janeiro, ficando impedido de ir ao féretro. Entretanto, na semana seguinte, fui para o Rio de Janeiro para acompanhar a missa de sétimo dia. Nós temos o hábito, como já escrevi em outro “causo”, de beber o morto, e tinha perdido o enterro, mas na missa podia esperar.

A igreja estava lotada, todos consternados, eu e minha esposa nos sentamos nos últimos bancos. Daqui a pouco estavam a meu lado os dois filhos do Seu Américo, que me indagaram para onde iríamos depois da missa, ao que respondemos que nem tínhamos pensado, sendo que fomos convidados para beber o falecido.

Assim foi. Fomos cerca de cinco casais e uma filha do Seu Américo, cujo marido estaria viajando. Fomos para um local chamado frango assado, onde comemos e bebemos todas as possíveis para comemorar o falecido, na certeza de que estava conosco e curtindo muito.

Sei que alguns vão dizer que somos doidos, mas fizemos, absolutamente, o que o Seu Américo fez tantas vezes conosco. Lembro até de um amigo que, depois de beber algumas, disse:

– Oh! Casinha mal-assombrada!

Carlos A. M. Galetti é coronel da reserva do Exército, foi comandante do 34o Batalhão de Infantaria Motorizado. Atualmente é empresário no ramo de segurança, sendo sócio proprietário do Grupo Iguasseg. 

Vivendo em Foz já há mais de 20 anos, veio do Rio de Janeiro, sua terra natal, no ano de 1999, para assumir o comando do batalhão.

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