O grupo “Elogios e reclamações de Foz do Iguaçu”, no Facebook, trouxe na tarde desta segunda-feira (29) o relato de uma mulher que sofreu abuso quando criança e, agora, procurou a polícia para denunciar. E quase não conseguiu.
A polícia informou que a denúncia tem que ser feita até seis meses depois do abuso, segundo o relato de Khrys Oliveira.
Puro desconhecimento dos policiais, que apenas prejudica as vítimas e aumenta a impunidade dos abusadores.
Na verdade, a prescrição para crime de abuso e exploração sexual de menores é de 20 anos, mas não a partir da data em que o crime foi praticado, e sim quando a vítima completa 18 anos (veja mais abaixo).
A lei é de 2012 e é sábia. A vítima de abuso infantil muitas vezes levará anos até se conscientizar e criar coragem para denunciar.
Foi o caso de Khrys.
Ela contou no Facebook que, aos 5 anos, sofreu abuso por parte de um tio, que pediu sigilo porque “meus pais seriam capazes de matar ele”.
Khrys nunca contou pra ninguém. E, 22 anos depois, ainda com “um misto de vergonha e medo”, já achava que era melhor “deixar pra lá”.
Mas, no Natal, em conversa com o namorado, que comentou alguma coisa sobre esse assunto, ela decidiu contar tudo a ele. Inclusive sobre o trauma de ser chamada de “anjo”, tanto por ele ou por outras pessoas, quando ela se sentia tão impura desde criancinha.
O namorado fez com que ela finalmente contasse o caso pra família. “Que alívio, chorei e me libertei daquele peso que me atormentou mais de 20 anos”, contou a jovem.
E não é que, no dia seguinte, o abusador entrou em contato com ela, para perguntar como tivera coragem de denunciá-lo à família? “Como eu tive coragem? Como ele teve coragem, eu era apenas uma criança, eu tinha 5 anos apenas. Como ele teve coragem?”, perguntou-se Khrys.
No dia seguinte, nervosa e com medo, ela foi à delegacia da Polícia Civil fazer a denúncia.
Foi quando ouviu do policial que o crime estava prescrito, que o prazo para denunciar era de seis meses após o ocorrido.
Dali ela foi à Delegacia da Mulher e, pra seu espanto, o policial que a atendeu disse a mesma coisa. Mas Khrys insistiu e disse que queria fazer um B.O. de ameaça, porque tinha medo de represália contra ela ou contra seus pais.
Foi então que, ao dar o nome do abusador,apareceu na tela do computador a ficha do sujeito, com diversos processos pela mesma prática. Aí, ela foi levada a uma escrivã, para depor sobre o abuso sexual de que foi vítima.
Conseguiu, então, representar criminalmente contra o abusador. “Finalmente!”, disse ela.
Mas Khrys continuou indignada porque não aceitou saber que os crimes semelhantes aos de que foi vítima prescrevem em prazo tão curto.
Khrys, isso não é verdade!
Veja este texto publicado no site do Ministério Público Federal em 2012:
Prescrição para crime de abuso e exploração sexual de menores tem prazo estendido
Desde o dia 18 de maio (de 2012), Dia de Luta contra o Abuso e Exploração Sexual de Crianças e Adolescentes, entrou em vigor a Lei nº 12.650, que modificou as regras relativas ao prazo prescricional dos crimes contra a dignidade sexual de crianças e adolescentes.
Antes, a prescrição, ou seja, o tempo para o agressor ser julgado ou punido pelo Estado, era contada a partir do crime praticado. Hoje, ela começa a ser contada quando a vítima completar 18 anos. Essa lei altera o Código Penal para dar mais tempo para que a criança ou adolescente que tenha sofrido abuso sexual possa ingressar com uma ação penal contra o agressor.
Na prática, como isso funciona?
Por exemplo, uma criança sofre um abuso sexual aos 12 anos de idade, um estupro. Este crime é de maior gravidade e prescreve em 20 anos, ou seja, de acordo com a lei antiga, a criança teria 20 anos após o ato para denunciar o agressor: 12 + 20 = 32. Então, ela teria até os 32 anos para denunciá-lo.
Pela nova lei, ela pode denunciar até os 38, ou seja, 18 anos (quando começa a prescrição) + 20 anos. Como, muitas vezes, os crimes são praticados por pessoas próximas à criança, ela não consegue denunciar o agressor, por medo ou vergonha, mesmo porque ela, na maioria das vezes, também não entende bem o que aconteceu. Agora, ela pode chegar a maioridade e, com mais maturidade e independência, fazer a denúncia.
A lei levou o nome de “Lei Joanna Maranhão”, nome da nadadora pernambucana que, em 2008, revelou ter sido abusada na infância por um treinador. Sua coragem de revelar seu segredo, segundo ela, pode até ajudar outras pessoas a fazerem o mesmo.
No Brasil, nós temos o Disque Direitos Humanos, o Disque 100, onde pode ser denunciada a agressão, pois esse serviço trata, entre outros, de grupos sociais vulneráveis, como as crianças e os adolescentes.